sábado, 20 de outubro de 2007

Never forget Nirvana


Eu era o roqueiro clássico em 1991. Era fanático pelo básico: U2, Beatles, Stones e Pink Floyd. Conhecia alguma coisa de Lou Reed, Velvet Underground, Pixies, Echo and The Bunnymen e Bob Dylan e muito, muito Led Zeppelin, Doors, Joy Division e Jesus And Mary Chain. Me informava o máximo que podia aqueles tempos.

Lembro do belo dia em que ouvi Nevermind, do Nirvana, pela primeira vez. Foi em 1992, na casa do Xuxa, um amigo um ano mais velho, que tinha amigos mais velhos e se informava mais sobre novidades. Lembro que “On A Plain” me cativou, mas não saquei muito o resto. De cara, não entendia toda aquela gritaria, aquela guitarra pesada... Em suma, eu era um cabação.


Tinha minha namorada, estudava jornalismo numa faculdade particular na minha própria cidade, tinha minha banda de rock que me satisfazia artisticamente, onde despejava meus últimos arroubos de lirismo adolescente. Tava bom assim.


Isso seguiu assim até que um cara “esquisitão” do curso de Publicidade, o Toni, que eu considerava meio que uma entidade, me convidou para assistir ao show de uma das bandas dele, o Anywise Pub. Não lembro onde foi, sei que foi em 92 também, e a ficha começou a cair. Aos poucos, eu começava a me distanciar do som que fazia e passei a defender que o som da Nowhere, minha banda, tinha que ficar mais pesado.


No final de 92 e em 93, com o Hollywood Rock, foi o boom no Brasil do som grunge. Lembro que não gostava muito daquela coisa de clipes do Temple of The Dog, Pearl Jam, Alice in Chains, Soundgarden, Smashing Pumpkins, Stone Temple Pilots e Nirvana o tempo todo na MTV, que ficava ligada full-time no barzinho da faculdade. Não entendia, no meio do fenômeno, o que estava acontecendo. Não entendia como bandas underground até dois anos antes estavam bombadas na TV. Nem pensei em assistir ao Nirvana no Hollywood Rock. Achava o Alice in Chains mais legal e vi os caras pela TV.


Ok, assim seguiu. O som da Nowhere foi ficando mais pesado e eu vendo a revolução grunge pela TV. Até que vi o Corsage, a outra banda do Toni tocar. Uau! Não era, definitivamente, um som grunge, mas consegui ver como uma pessoa com influências dos anos 80 poderia atualizar o som que curtia. Ali a ficha caiu de vez e eu queria conciliar meus novos gostos com os antigos e o som da minha banda, mas ainda não foi a vez do Nirvana, que cada vez parecia mais legal para mim, mesmo depois daquele disco de lados B´s, então esquisitos para mim, o Incesticide.


E, enfim, aconteceu o que até então ninguém esperava. Kurt Cobain se matava com um tiro na cabeça em abril de 94 em Seattle, pouco depois de uma overdose em Roma. Lembro que fiquei abaladíssimo e comprei o Nevermind no dia que soube da notícia. Pouco depois comprei o segundo do Alice in Chains, mais uns meses e ganhei o Ten, do Pearl Jam. Lembro do vendedor estúpido da loja onde comprei o disco. “É, só porque o cara morreu, tá todo mundo comprando essa merda de novo”.


Eu lembro de ter ouvido Nirvana o dia inteiro aquele dia e a ficha caiu totalmente. Todo mundo que curtia som sabia dos problemas com drogas de Kurt e todo mundo esperava que ele morresse de overdose um dia, mas não que se matasse com um tiro na cabeça. E em 1994! Não agora.


94 passou devagar, com pesar. Naquele ano minha banda se dedicou durante seis meses, fazendo poucos shows e ensaiando apenas três músicas, gravadas em novembro. Adorei o resultado, mas achei o som desconectado de tudo o que acontecia a nossa volta. Não aguentava mais viradas sofisticadas de bateria. Queria fazer um som pesado, eu queria alterações drásticas de dinâmica, à la Nirvana, eu queria ser sincero com a minha dor interna, eu queria fazer barulho.


Queria misturar aquela massa pesado-melódica do grunge com tudo o que havia aprendido de rock até então, especialmente o som mais dark de Jesus and Mary Chain e Joy Division. No verão de 1995, já estava montado o Embryo, powertrio de som pesado do qual me orgulho. Em maio, tocamos em nosso primeiro festival e dedicamos um cover de “About a Girl”, do Bleach, ao Kurt. O Smelly Guys, que tocou no mesmo dia, fez uma versão matadora de “Serve The Servants”, do In Utero. O Joãozinho chorou depois de tocar a música. Tinha se lembrado de muitas coisas, talvez, mas, com certeza tinha se lembrado de Cobain.


Depois disso, Nirvana e outras bandas da época entraram no repertório e influenciaram o Embryo. Nos shows posteriores fizemos “Molly´s Lips”, cover do Nirvana para uma canção do Vaselines, “Been a Son”, “Lithium” e "It Ain´t Like That", do AIC. Lembro especialmente da versão de “Lithium” que fizemos no palco do verão da prefeitura de Praia Grande, mesmo palco em que Roberto Carlos, de quem sempre fui grande fã, e Mamma´s and The Papas haviam tocado. Chovia, mas uns 70 gatos pingados ficaram pulando sob o toró. Na rua, caminhando pelo calçadão depois do show, éramos reconhecidos. Lembro de uns moleques do ABC, gritando para a gente. “Yeah, yeh, yeah...”, como no refrão da canção... Estava no céu, até ter que me virar no meio da enchente para sair da cidade, sem ônibus, com os grandes parceiros Ivair e Mauro, que havia conquistado uma garota depois do show... Sexo e rock´n´roll, perfeito! Era o meu ideal de vida. As drogas eu sempre dispensei. Não queria acabar como Kurt ou Lanney Staley...


E em agosto de 1996, eu fui trabalhar em São Paulo. Pouco antes, Mauro havia deixado o Embryo, mas o som não tinha morrido em mim...


Onze anos depois, trabalho para preservar a memória da minha história no rock´n´roll e, quem sabe, juntar a molecada para um som. No meio disso, tenho mergulhado na leitura de livros super rock´n´roll e me deparei com a biografia de Kurt aqui em casa. “Mais Pesado que o Céu”, de Charles R. Cross, 400 páginas que devorei em cerca de 10 dias. Um livro perfeito, uma aula de jornalismo, com informações de toda a família de Kurt, amigos, empresários, outros jornalistas... E, constatei, Kurt Cobain nada mais foi do que um gênio. Maluco, mas um gênio. E esse cara mudou minha vida e minha percepção da música. Obrigado, Kurt. I´ll never forget Nirvana.

Cotações:

Bleach (1989) - ****1/2

Nevermind (1991) - *****

Incesticide (1992) - ****


In Utero (1993) - ****1/2

Unplugged in New York (1993) - *****

From The Muddy Banks of The Wishkah (1996) - ****

Singles (Box Set) (1995) - ****

Other Stuff:

Todos os CDs com artes, fotos e informações. In Utero completo com letras.

Cotação: ****1/2 (para todos)

domingo, 14 de outubro de 2007

REVOLUCIÓN, ENFIM!!!!


No mês em que o assassinato de Che Guevara completou 40 anos, eis que houve, enfim, a revolução. O Radiohead, uma das maiores bandas em atividade, com um catálogo de hits realmente importante, milhões de discos vendidos no mundo todo, com um vocalista esquisitão, mas carismático, rompeu de vez o cordão umbilical com a indústria. E pela primeira vez eu me senti compelido a, enfim, baixar um disco.


O grupo lançou seu novo disco no dia 10 de outubro pela internet (www.inrainbows.com), sem ter contrato assinado com nenhuma gravadora. Os ingleses deram ao fã duas opções no lançamento: baixar as dez faixas ou adquirir uma caixa especial, cheia de mimos, por quase R$ 150 (40 libras).


O detalhe: ao optar pelo download, o cliente poderia atribuir ao disco o preço que quisesse. Pela primeira vez, uma banda tornava tangível o conceito abstrato, mas verdadeiro, de que música não tem preço. Se quisesse, o cliente poderia atribuir zero como valor e pagar somente menos de meia libra a título de taxa de administração. Eu optei por pagar 1 libra, mais a taxa, ficou algo em torno de R$ 6.


Acho absurdo o preço atualmente cobrado por downloads oficiais nos sites de gravadoras ou lojas virtuais. Geralmente, paga-se entre R$ 1,90 e R$ 2,50 por uma faixa, o que definitivamente não vale um arquivo de MP3, o qual todo mundo sabe que não tem a mesma qualidade de um arquivo de áudio em um CD. E o consumidor não fica com nada tangível em troca, apenas arquivos, que podem ser perdidos com um simples esbarrão na tecla delete.


Esse mercado acentuou a compra de faixas e as pessoas ignoram informações sobre o que estão comprando_ ou seja, a arte de colecionar discos está sendo assassinada, como vários prazeres vêm sendo aniquilados nesta virada de século. Como digo no texto de apresentação do blog, é a banalização. As coleções de discos podem desaparecer. Não há mais nada para curtir, para chamar de seu.


O Radiohead, no seu pioneirismo, tenta romper com esse formato duas vezes. Primeiro, ao tornar o download a primeira forma disponível de se obter o álbum, e, segundo, ao não vendê-lo fracionado, ao não desmontar o conceito do álbum. É esperar para ver. Eu torço para que dê certo_ uma alternativa ao que considero a impessoalidade do download.


IN RAINBOWS – Radiohead volta ao paraíso


Após a quinta audição, não tenho dúvida. In Rainbows é um álbum pop, ao contrário do que disseram muitos jornalistas nas primeiras resenhas publicadas ao longo da semana passada.


Marcado por arranjos com arpejos de guitarra, o disco é repleto de melodias assobiáveis, de assimilação um pouco difícil, sim, mas, seguramente, é uma evolução, mais suave, da linha quase convencional trilhada em “Hail To The Thief” (2003), o último CD da banda. É o melhor álbum do grupo desde OK Computer (1997). Vai lá: www.inrainbows.com e compre o seu.


15 Step – Percussão, efeitos. Aos 45 segundos, entra a guitarra. Arpejos, slides, a melodia é circular e abre o disco com estilo;


Bodysnatchers – Rock´n´roll. Guitarras sujas lembrando Sonic Youth dominam a faixa. Pop, a canção tem até uma ponte grudenta antes do batidão sujão voltar;


Nude – Você se sente nos fundos de uma sala, onde violinos são tocados próximos do teto, como nos camarotes de um teatro. Sobre o arranjo de baixo, Yorke canta maravilhosamente;


Weird Fishes/Arpeggio – A faixa começa com percussão e logo surgem os arpejos , como o próprio nome da canção diz.

Yorke canta um arremedo de refrão:

“in the deepest ocean/ the bottom of the sea/ your eyes, they turn me/ why should I stay here?”.

A batida acelera, como peixes estranhos em um aquário;


All I Need – A mais estranha e também a mais pop. A faixa começa com um belo cello, mas sua batida lembra Joy Division e leva o ouvinte ao primeiro refrão nítido do disco... “you´re all I need”;


Faust Arp – Uma faixa bem rural, passa sensações campestres. Uma mistura de Pink Floyd pré-dark side com Nick Drake;


Reckoner – Novamente arpejos e percussão. Yorke canta como se murmurasse alto. O piano marca uma transição e a faixa termina com um cello matador. É a minha preferida, de longe;


House of Cards – Com apenas 5´25, é a faixa mais longa do disco. Começa com uma guitarrinha meio bossa, meio suingada. “I don´t wanna be your friend/ I just wanna be your lover”, canta o ET Yorke. Parece minha vida!;


Jigsaw Falling Into Place – Violão e bateria acelaradinhos. Gostosa. “C´mon and let it out”, “repete” o pastor Yorke neste quase-refrão;


Videotape – Belo final de um belo álbum. Tá nublado na praia, hora de correr para casa, sem antes não deixar de apreciar o mar se tornar uma mancha cinza.


Cotação: ****1/2


Other stuff – Por enquanto não tem other stuff. Além da opção do download, a banda oferece por 40 libras uma caixa com a versão de In Rainbows em vinil, CD, um disco com algumas faixas extras e muitos bichinhos e artes do “líder” da espaçonave Radiohead. Quem encomendou a caixona vai vê-la só em dezembro, perto do Natal. No início do ano que vem, deve sair a versão normal do disco, esperamos sem pilantragens, tipo faixas novas, o que descredenciaria toda a ousadia. E que as gravadoras fiquem longe desses meninos.

sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Um brinde ao Skank



“Quando a noite estender um manto sobre nós

Meu abrigo então será o som da sua voz”

O Som da Sua Voz (Samuel Rosa/Chico Amaral), in Carrossel


Essa história mistura o profissional com o sentimental. Era junho de 2000, e eu trabalhava como editor de música do site Zoyd quando me credenciei para a coletiva que o Skank daria em um flat da região da Paulista para falar à imprensa de São Paulo sobre o lançamento do CD Maquinarama.


Até então, tirando a capacidade inerente de fazer hits pop como “Jackie Tequila” e “Uma Partida de Futebol” e clipes bacanas, como “Mandrake e os Cubanos”, o Skank não havia me cativado, exceto uma versão sensacional, em espanhol, de “Wrapped Around Your Finger” e o primeiro sucesso deles, “Tanto”, versão de “I Want You”, de Bob Dylan, com uma letra linda de Chico Amaral.


A coletiva começou com uma audição de Maquinarama. Tudo era diferente. “Três Lados” já tocava no rádio, mas não deixava claro tudo que estava por vir. Lembro dos jornalistas boquiabertos, não acreditando (naquele tempo o Napster era uma sombra e os CDs ainda reinavam inauditos até o lançamento). O disco já era diferente até na capa, com a foto de uma obra do pós-moderno Kenny Scharff. Ah, e o baixista Lelo Zanetti estreava como compositor de uma faixa sozinho, "Canção Noturna", com letra de Chico Amaral, até hoje presente em todos os shows do Skank, tradição que se manteve nos discos seguintes.


O Skank tinha deixado o Ska em alguma esquina e se mirava em todas as suas outras influências pop. O disco já abria com uma parceria bacana de Samuel e Edgard Scandurra, em “Água e Fogo” e bebia em um pouco de tudo: Beatles, Clube da Esquina (ainda menos que no Cosmotron e Carrossel), R.E.M, música de filmes do Tarantino, Fausto Fawcett_ o que é “Balada do Amor Inabalável”, meu Deus? Pop perfeito, o mais carioca que quatro mineiros podem chegar, sem dúvida.


Enfim, tudo era diferente e a atitude tranqüila da banda na coletiva me cativou de vez. Eu era, a partir dali, um fã de carteirinha da banda e passei a prestar a atenção em tudo o que eles faziam. Depois comprei o CD Cosmotron, de 2003, e assisti dois shows daquela incrível turnê em São Paulo, inclusive a gravação do especial Multishow.


Cosmotron, aliás, tem minha música preferida do Skank, “Dois Rios”, parceria de Samuel, Lô Borges e Nando Reis, com um piano maravilhoso de Henrique Portugal, e o maior hit da história do grupo, a super-pop “Vou Deixar”. A música tocou até encher um pouco o saco, mas é inegável. É um hit massivo, impressionante. A introdução na Rickenbacker, as alterações de dinâmica, o coro no refrão, a ponte quase sussurrada. Que canção!


E eles continuam surpreendendo. Escrevo esse texto ouvindo o último CD deles, Carrossel, lançado ano passado. O álbum marcou meu relacionamento com uma pessoa muito incrível, mas tão maluquinha e confusa como eu. O relacionamento acabou, mas meu amor pela banda e o CD ficaram aqui, intocáveis na estante. É reconfortante saber que há espaço para melodia no pop-rock brasileiro, com gravações de qualidade em trabalhos excelentes de gente como o Skank, Acústicos e Valvulados, Los Hermanos, Ludov, Pato Fu e Ira!


Carrossel continua seguindo a trilha de novas parcerias abertas em Maquinarama. Hoje, além de Chico Amaral, na minha opinião, um dos três maiores letristas brasileiros, autor de versos lindos como “das volutas que moram dentro/ do meu pesamento morno”, de Fica (Maquinarama), o Skank tem como parceiros fiéis, Lô Borges, Nando Reis, Fausto Fawcett, Rodrigo Leão e Humberto Effe. E nesse disco entraram Arnaldo Antunes, em “Trancoso” e César Maurício, do Virna Lisi, autor da letra de “Seus Passos”, uma das mais belas do álbum ("nesse jogo de reflexos, a certeza me distrai...").

Na última segunda-feira, dia 1, assisti um show da turnê Carrossel, numa festa fechada de uma empresa (onde tirei a foto acima). Mesmo com a platéia carregada de plumas e paetês, proseccos e Red Labels, o Skank não deixou a peteca cair. É claro que não dá para escapar de “Uma Partida de Futebol” e “Jackie Tequila”, mas é possível ouvir pérolas como “Mil Acasos”, “Uma Canção é Pra Isso”, “Dois Rios”. Skank ao vivo ou no disco é isso, um brinde aos ouvidos e à sensibilidade.


Cotações:

Maquinarama (2000) - **** 1/2

Cosmotron (2003) - ****


Carrossel (2006) - *****

Other Stuff:

Todos os CDs com encartes completos, com arte, letras e informações.

Cotação: ***** (para todos)